Tomando sentimentos - texto meu

Tomando sentimentos

   Outro dia eu estava entrando numa loja e comecei a conversar com o vendedor a procura de um objeto. Enquanto ele esperava o computador ver se tinha o que eu queria no estoque, ele olhou para o lado - para a ala de crianças - e disse "poxa olha que sacanagem, estão vendo essa menininha sentada ali? Os pais dela tão lá passeando no shopping enquanto ela está aqui esperando eles chegarem." Eu só olhei assustada para ele e disse "como assim?", quero dizer, a loja que eu saiba não era nenhuma creche ou lugar para se deixar crianças enquanto os pais se divertem. Era uma livraria, que como qualquer outra tem um espaço especial reservados para o infantil, mas não há nada dizendo "deixe os seus filhos aqui."

   Enquanto o moço foi pegar meu livro do outro lado da loja, eu fiquei ali parada na frente do computador, olhando pra menina com uma certa pena e sem coragem de chegar nela e dizer que tava tudo bem que os pais dela logo chegariam.

    Quando o vendedor voltou eu perguntei onde estavam os pais dela e ele disse "quando deixaram ela aqui foram lá pra frente da loja, mas agora acho que sumiram, porque não estão mais lá". Eu olhei de volta para a garota assistindo um filhinho qualquer. Quando este chegou nos creditos, ela olhou para trás e nos viu mas nós sabíamos que seus olhos procuravam por outras pessoas.

    Ela era bem novinha, deveria ter no máximo uns cinco anos. Tudo bem que as crianças tem a mania de sair correndo e desobedecer os pais enquanto ele pedem para ela não correr e ficar perto deles. Mas esta era diferente. Parece até que os papeis foram invertidos e que os pais que correm por aí enquanto deixam a filha preocupada querendo saber onde eles estão. Vendo que eles não estavam por perto ela olhou para os livros com desenhos de fadas estampadas na capa. Ficou vendo toda a estante que conseguia alcançar e mais uma vez olhou em nossa direção, e nada dos pais dela. E então ela sentou no banquinho que estava sentada antes assistindo o filme e começou a coçar os olhos e suas bochechinhas ficaram vermelhas e ela abaixou a cabeça olhando para as meias coloridas em seus pés. 

    E então ela levantou a cabeça e olhou para nós de novo. Nem sinal de vida dos adultos que ela procurava. Enquanto o lojista me dava o livro perguntando se era aquele mesmo a menina olhou para mim e quando olhei para ela seus olhos estavam vermelhos também e seu rosto inchado de lágrimas.

    De repente, não sei como, comecei a sentir as emoções da menina. Era como se eu estivesse dentro dela. Vinham perguntas na minha mente do tipo "cadê eles?",  "por que eles não estão aqui?", "eles não se esqueceram de mim, esqueceram?". Eu senti uma dorzinha se instalar no meu peito. Eu queria dizer que eles chegariam, mas eu não podia, se dissesse isso ela iria pensar que eles a deixaram ali porque não queriam ela junto com eles. Então fui até a fila comprar meu objeto e saí da loja. Eu não sabia como eram os pais da garota, mas sabia que com certeza eles não estavam lá, afinal não havia ninguém por perto. 

   Fui então até uma pequena lanchonete que ficava ao lado e sentei na ultima mesinha como de costume e pedi uma empadinha e um suco. Vi que um casal chegou perto do balcão desesperados. A mulher gritava com o marido. O marido tentava fazer o pedido, e nós meras pessoas mortais que não tínhamos nada a ver com isso estávamos assistindo. Bati os olhos neles e reconheci mesmo não sabendo quem eram ou qual os nomes deles. Aqueles eram os pais da pobre menina. A mulher era igualzinha a ela, mesmo tom de pele, mesmo olhos pretos preocupados. Sem dúvida alguma aquela era a mãe. E não querendo me interferir na vida alheia mas se o homem estava junto da mulher, provavelmente seria o pai. 
   Eles estavam tão loucos que só naquela hora pareciam perceber que lembravam que AINDA TINHAM uma filha esperando por eles. E aí a menina saiu da livraria com o vendedor e viu os pais na lanchonete e correu para abraçá-los e então os pais "onde você se meteu menina?". Isso lá é coisa que se diga AQUELA MENINA? Posso dizer que pelo amor de Deus, vocês que são pais e adultos sejam responsáveis e saibam reconhecer seus erros ok? Não é só porque ele/ela é seu filho/filha e que são mais novos que eles tem que ser os não-responsáveis. Não! Por favor assumam os erros e prestem mais atenção nas coisas que realmente valem mais para vocês.

Bia